Museu de Arte Murilo Mendes | MAMM

30ª Bienal de São Paulo – A iminência das poéticas seleção de obras

A 30ª Bienal de São Paulo – A iminência das poéticas, não possui um tema. A articulação das ideias de Iminências e Poéticas é, para nós, curadores da 30ª Bienal, apenas um “motivo”. A diferença entre “tema” e “motivo” é importante: o “tema” é um conteúdo e uma tese; o “motivo” é um pretexto, um aglutinador, o ponto de partida para uma série de perguntas, para o estabelecimento de uma estratégia discursiva. Não pretendemos que os artistas convidados para a 30ª Bienal “ilustrem” ou “representem” nosso motivo. Apenas queremos que suas obras entrem em ressonância com a constelação de perguntas que podem ser deduzidas desse motivo: como a arte contemporânea, e o que resta entre nós do legado da modernidade, “funcionam” em um mundo de iminências, de acontecimentos por vir, marcado cada vez mais pela imprevisibilidade, pela dificuldade de ser pensado; como acontece em sua iminência a arte; e como é, ou responde, em última instância, a prática artística a uma série de decisões poéticas, expressivas, discursivas, enunciativas, vocais.

O trabalho de curadoria não é um trabalho de historiador. A iminência das poéticas se apresenta como um aparato discursivo, ele mesmo tentativo e experimental, no qual o que prevalece são os vínculos, as relações, as potências constelares entre obras e artistas, eventos performáticos e pensamentos. A 30ª Bienal aspira, portanto, contribuir com o estado de uma discussão em permanente iminência de mudança e não pretende, por tanto, afirmar-se com respostas definitivas, ortodoxas, messiânicas. A curadoria da 30ª Bienal não está fazendo história: está tão-somente contribuindo para a construção do presente, a partir da inteligência e do diálogo, desinteressadamente.

Não nos interessa a novidade em si mesma. Interessa-nos oferecer um olhar sobre os “processos” artísticos, conscientes de viver um tempo crítico no qual ainda nossos dois séculos – o XX e o XXI – mutuamente se colapsam.

Sobrevivências, Alterformas, Derivas, Vozes foram unidades conceituais que nos permitiram dirigir nosso olhar e nossa busca, nossa investigação. O desafio de uma curadoria, porém, não consiste em traduzir uma ideia, mas em “inventar-se” no espaço real. Estamos fazendo uma Bienal constelar, dentro e fora do Pavilhão da Bienal: nela o público encontrará uma série de seleções de obras de cada artista, constelarmente organizadas, algumas quase retrospectivas e vinculadas às seleções que lhes são vizinhas.

Os artistas da 30ª Bienal foram escolhidos pela distinção do fundamental de suas vozes, porque falam, ou não falam, de uma coisa ou de poucas; não de tudo nem para todos: ou deles, para eles. Os artistas da 30ª Bienal não são experts, são artistas: representam, calam, falam a partir do mesmo eco escuro de onde ressoam as dúvidas e as vagas certezas da existência: a densidade arquipelágica da vida: seu lugar e seu não-lugar: seu entre-dois.

Os artistas da 30ª Bienal foram escolhidos em virtude de sua atenção às coisas como reino diferente da imagem, e em suas obras, além de ser reconhecida a distância entre coisas e palavras, as imagens existem mais como coisas que como imagens, como âmbitos de questionamento – inclusive no testemunho documental – da identidade impossível entre as imagens e o mundo. Os artistas da 30ª Bienal atestam, em suas obras, a letra viva, ou a memória viva: acreditam na sombra, no rastro e no corpo como acervo único para a sobrevivência, a alterforma, a deriva, a voz. Os artistas em A iminência das poéticas são todos contemporâneos: não é outra a iminência da poética: vir a ser, ali, em seu nicho, contemporâneos: atualizar-se com suas sombras no voo de luz da palavra na ponta da língua, e mesmo quando não seja dita: chegar junto com a imagem, ou o som, ou o silêncio, em suas potências.

A dimensão constelar da Bienal se encontra, no fim das contas, nos olhos e na mente de cada espectador, na medida em que este se abra à experiência da Bienal. Para isso, os instrumentos discursivos da Bienal, como este SITE, ou como a expografia, o catálogo, as publicações, a identidade visual, são fundamentais: aspiramos à claridade e à funcionalidade, e tal como nossa equipe expográfica manteve eixos abertos que oferecem uma dimensão de transparência dentro do Pavilhão, assim também a arquitetura do SITE se propõe a ser coerente com esta fluidez.

A iminência das poéticas deseja oferecer um olhar que produza sentido, um olhar que se faça a si mesmo junto à inteligência e ao olhar dos outros.

Luis Pérez-Oramas
Curador da 30ª Bienal de São Paulo – A iminência das poéticas