Museu de Arte Murilo Mendes | MAMM

Homenagem a Kounellis – Cesár Brandão

“O ovo é um monumento fechado, automonumento; (…), do germe inicial da criação”: – Fragmento da primeira frase da prosa “O Ovo” do livro Poliedro de Murilo Mendes; e que às vezes pode reverberar as proposições de alguns artistas.

Há artista que, talvez em sonho ou utopia, trabalhe na busca “do germe inicial da criação”, um “quase-ovo”; mas, humanos, penso que somente criamos simulacros.

E este simulacro, ou instalação, que mostro aqui na Galeria Poliedro do Museu de Arte Murilo Mendes em “Homenagem a Kounellis”, se acaso refletir alguma aproximação ao ovo, apenas será por resultar, talvez, em objetos similares construídos do mesmo molde (“automonumento” de um ovário?…), e terem diferenças, imperfeições, características próprias… Nenhum ovo é igual ao outro.

Assim, a ideia dessa instalação surgiu ao ler entrevista de Jannis Kounellis em que afirma que usa aqueles materiais no trabalho, influenciado pela “vivência” de muito tempo em região portuária. E isso coincide com possível definição de arte (dentre inúmeras) que consta em alguns textos meus: arte também pode ser o resultado de “vivência e cultura”. Filho de operário, até aos 20 anos vivi em bairro a contornar indústria que pai trabalhava, com fornos para carbureto e ferro silício. E, na infância e adolescência, fiz desenhos daqueles fornos, e vi fogo, fumaça e materiais ali utilizados: cal, carvão, pedra cristal, sucata… e os produtos resultantes nas fundições (e sempre usei essas matérias em instalações ou objetos).

Daí minha fascinação por fundições não apropriadas às obras de arte, e que geram cópias precárias, próteses incorretas, arcaicas reproduções… o que talvez possibilite remeter, em oscilante antítese capenga, ao texto de Walter Benjamin: A obra de arte na época de suas técnicas de reprodução. E aqui, na instalação em Homenagem a Kounellis, estão dez “reproduções” fundidas em alumínio reciclado, também reproduções do esboço e foto do objeto fundido, e o molde original que é feito em compensado quebrado, cola e bombril, barra de ferro parafusada, pregos, alumínio amassado, etc… e este molde foi maquiado em purpurina prata: pindaíba, paliativo, gambiarra… que, mesmo sem esse propósito, talvez quase se aproxime do “título” da 30ª Bienal de São Paulo: “A Iminência das Poéticas”.

César Brandão, março/2013

(tem obras no acervo do Museu de Arte Contemporânea – MAC-USP; do Museu de Arte Moderna – MAM-SP; e participou da 19ª Bienal de São Paulo, em 1987).