Museu de Arte Murilo Mendes | MAMM

Restaurador do MAMM resgata a história da visionária Guita Mindlin

Com um verdadeiro tributo à trajetória de Guita Kauffmann Mindlin, o pesquisador e restaurador doutor Aloisio Arnaldo Nunes de Castro, do Museu de Arte Murilo Mendes (MAMM), analisa, em artigo aprovado em março e já disponível pelo prestigiado periódico científico “Revista PÓS –Programa de Pós-graduação da Escola de Belas Artes da UFMG”, uma das figuras mais importantes da história da conservação e da restauração de documentos gráficos no Brasil.

Guita Mindlin Foto de Lúcia Mindlin Loeb

Notória pela doação, junto com José Ephim Mindlin, do acervo que constitui a Biblioteca Brasiliana da Universidade de São Paulo (USP), a homenageada chegou a exaltar a preservação e a restauração da coleção de livros e artes plásticas de Murilo Mendes, tendo sido, ao lado do marido, presença marcante na exposição comemorativa ao centenário do poeta juiz-forano, em 2001, como membros do Conselho Curador do antigo Centro de Estudos Murilo Mendes (CEMM), hoje MAMM/UFJF.

Responsável pelo Laboratório de Conservação e Restauração de Papel do MAMM/UFJF, Castro analisa a extensa contribuição de Guita, ressaltando seu papel à frente da Associação Brasileira de Encadernação e Restauro (ABER), que, em 1996, passou a designar seu laboratório como Núcleo de Conservação e Restauro Edson Motta, este um notório juiz-forano no campo das artes e pioneiro da restauração no Brasil.

Aloisio de Castro – Crédito: Lauro Bohnenberger

O estudioso assinala a importância de se destacar que, em gesto pautado pela generosidade e pela confiança na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), o casal Mindlin chegou a doar, em 2001, um significativo lote de documentos manuscritos por Murilo Mendes para o setor de arquivo do então CEMM, hoje parte relevante dos documentos salvaguardados pelo MAMM. O ato foi celebrado em 12 de maio, às vésperas do aniversário do poeta.

Para a fotógrafa Lúcia Mindlin Loeb, conselheira da ABER e neta da eminente restauradora, e responsável por algumas das mais expressivas imagens do casal Mindlin, a publicação de Castro vai ao encontro do empenho de Guita em se aprofundar na preciosa arte da restauração e da conservação em papel.  “Minhas melhores palavras são as imagens. Minha avó sempre fez muita questão de dividir o conhecimento e, sem dúvida, esse e outros artigos colaboram muito nesse sentido. Por isso, agradeço muito o cuidado e o trabalho”, assinala. 

Guerreira da preservação

“Criada no ano de1988, em parceria com Thereza Brandão Teixeira, a ABER tem um caráter fundamental, conseguindo reunir, através dos anos, inúmeros profissionais ligados à encadernação artesanal, ao restauro e à conservação em papel, despertando o interesse e a atenção para a documentação gráfica em geral, como livros, documentos, manuscritos e impressos”, diz.

A preocupação de Guita com a educação profissional no campo da restauração e da conservação gráficatrouxe o desafioda formação especializada para ingresso no mercado nacional. “Daí a importância doCurso de Conservação-Restauração de Documentação que, por sua influência, a Escola SENAI Theobaldo De Nigris passou a oferecer, demonstrando seuengajamento com a formação dos conservadores-restauradores e a causa do reconhecimento profissional”, analisa.

Castro assinala que o arquivo pessoal desta visionária, formado por documentos reunidos no decorrer de seu percurso profissional, também foi incorporado à Biblioteca Brasiliana e pode ser visto como uma extensão de sua própria memória. “Esse acervo em particular pode ser analisado como vestígios interpretativos tanto de sua experiência humana quanto profissional de Dona Guita”, informa.

Trata-se do Fundo Documental Guita Kauffman Mindlin (GKM), com 3.734 itens textuais, iconográficos, sonoros e audiovisuais, relativosao períodoentre 1970 e 2000, em quesua dedicação à conservação e à restauração se tornou ainda mais notável, especialmente nos anos 1980 e 1990. Esse acréscimo à Brasiliana se deu em 2013, quando da inauguração do magnífico prédio e da abertura da Biblioteca ao público”, destaca.        

Segundo Castro, são inúmeras as contribuições de Guita para a construção cultural no contexto preservacionista, em que se distingue também seu entusiasmo pela reenfibragem de papel, culminando na fabricação de um modelo de manuseio mecânico, que lhe permitiu a restauração do livro “Marília de Dirceo”, rara edição de Thomaz Antonio Gonzaga realizada no ano de 1810pela Imprensa Régia.

Casal Mindlin na UFJF

Percurso profícuo

Guita Kauffmann Mindlin nasceu em São Paulo, em 1916, tendo entrado, em 1936, para a faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde conheceu José Ephim Mindlin, com quem se casou dois anos depois. Não chegou a atuarno campo jurídico, mas, apaixonada pelos livros, dedicou-se, a partir da década de 1970, à conservação e à restauração do acervo que, ao longo de mais de sete décadas, formou com o marido.

Em 1981, aos 65 anos, iniciou sua formação definitiva a partir de um estágio no Laboratório de Conservação e Restauração de Documentos Gráficos (LACRE) da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB). A partir de então, seu trabalho foi um diferencial no contexto preservacionista, graças à sua dedicação e à sua rede de sociabilidade, que proporcionou um intenso intercâmbio, favorecendo a disseminação do conhecimento nessa área.

Castro deixa claro que o sentido de pertencimento de Guita ao campo da preservação dos documentos gráficos pode ser avaliado por sua filiação ainúmerasinstituições de classe brasileiras e estrangeiras. Em um período anterior à Internet, manteve contatos frequentes com entidadesdos Estados Unidos, da Europa e da América Latina, valendo-se também da assinatura de periódicos especializados.

Concluindo, Castro observa que, ao longo de seu percurso, Guita conseguiu expressar sua inquietação e seu interesse pela preservação bibliográfica, buscando soluções e destacando a necessidade de conscientização sobre os problemas que permeiam a memória no tocante à salvaguarda dos livros e dos documentos pertencentes a acervos tanto públicos quanto particulares.

Serviço

Para conferir o artigo na íntegra acesse o link:

https://periodicos.ufmg.br/index.php/revistapos/article/view/25864/27889

Fotos:

  1. Guita Mindlin trabalhando no ateliê de restauro e conservação montado em sua residência em São Paulo (Crédito: Lúcia Mindlin Loeb)
  2. Ao centro, José e Guita Mindlin, membros do Conselho Curador do Centro de Estudos Murilo Mendes (CEMM), em reunião de 12 de maio de 2001. Na foto, também estão os conselheiros Wander Melo Miranda, Laís Corrêa Araújo, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos, Murilo Marcondes de Moura, Luciana Stegagno-Picchio, Vera Alencar e Marcelo Araújo. Fonte: Arquivo Institucional do MAMM

O restaurador Aloisio Arnaldo Nunes de Castro em sua sala no Laboratório de Conservação e Restauração de Papel do MAMM/UFJF. (Crédito: Lauro Bohnenberger)